Certas palavras… (5)

gordine

Escuderia. Foi nos anos 1960 que ouvi pela primeira vez essa palavra. Morava no Ipiranga, na Rua Xavier Curado, 243. A dois quarteirões dali está o Museu Paulista, hoje fechado para reformas.

Nessa região predominavam os palacetes das famílias Jafets. Foi ali, a uma quadra de onde morava, que o Bandido da Luz Vermelha assaltou pela última vez e matou o vigia. Hoje, várias dessas mansões foram derrubadas e se transformaram em prédios. Mas, na ruas Bom Pastor e Costa Aguiar, ainda se veem algumas delas — na que o Bandido da Luz Vermelha entrou funciona uma empresa privada, mas já foi até banco.

A casa em que eu morava, na Xavier Curado, era nos “fundos”. Na frente morava a Dona Mariinha, proprietária e mãe do Wagner, chamado pelos colegas de Anão, devido ao seu tamanho. Seu Onofre Theodoro, marido de Dona Mariinha tinha dinheiro, pelo menos era o que eu pensava naquela época. Trabalhava na Companhia Telefônica Brasileira, que mais tarde se tornou Telesp, Telefônica e, atualmente, Vivo. Wagner não trabalhava, era sustentado pelo pai. Era o típico playboy da época. Seu prazer eram os carros e as garotas.

Na década de 1960, a TV Record (Canal 7), dominava a audiência — a Globo ainda não existia. Além dos famosos festivais de música popular brasileira e outros musicais, a Record movimentava o público com gincanas. O vencedor levava um carro como prêmio.

Para competir, os participantes tinham de montar escuderias, ou seja, equipes com carros identificados para correr atrás das solicitações. Estas, como não se tinha TV ao vivo, eram divulgadas pela Rádio Panamericana (AM), hoje Jovem Pan, emissora que também pertencia a Paulo Machado de Carvalho, dono da Record.

Wagner montou a Escuderia HRRA (lê-se “agarra”). Como o “quartel general” era na Xavier Curado, eu acompanhava tudo de perto ao lado do neto de Dona Mariinha, o Wagninho, garoto de minha idade.

Ao longo de um sábado ou domingo inteiro, inúmeras escuderias paulistanas corriam atrás das solicitações. Lembro-me de algumas delas: uma mulher negra de olhos verdes; um casal de anões; uma placa de trânsito; etc. Assim que as tarefas eram cumpridas, tinham de ser levadas para a TV Record, na Rua Augusta. No fim do dia, vencendo ou perdendo, o ponto de encontro era no Bar do Vintém, na Costa Aguiar.

simcaNão vi a HRRA vencer nenhuma competição, mas, mesmo como meus quase dez anos de idade, percebia a importância de se trabalhar em equipe. Dirigindo os carrões da época como Kombi, Simca Chambord (foto ao lado), Gordine (foto acima), Dauphine, 1093 e DKW — todos com tala larga e escapamento aberto — aqueles jovens mexiam, literalmente, com a cidade.

Ao lado do Ipiranga, na Mooca, a Escuderia Pepe Legal sobrevive até hoje e até montou um motoclube e um time de futebol (veja detalhes aqui). Visite também o site de Flávio Gomes, um entusiasta das escuderias.

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Uma resposta para Certas palavras… (5)

  1. Cleiton disse:

    Gostei de seu Blog! muito interessante!

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