Apesar de o baile encerrar as festividades de formatura, é a colação de grau o evento mais esperado – pelo menos para os formandos uni-versitários que recebem o título acadêmico. A ocasião é solene. Após homenagens e discursos, a turma recita um texto de gran-de beleza hu-mana e literária e firma o compromisso profis-sional – o juramento.
Com raízes fincadas também nos costumes contemporâneos, o juramento está presente tanto em cerimônias de casamento como em posses de chefes de Estado. E engana-se quem pensa que essa tradição é recente. Ela surgiu em Roma, durante o Império Caro-língio (séculos 8 e 9), com a função de selar o contrato vassálico – aliança de fidelidade que regulamentava obrigações de obediência, serviço militar, proteção e sustento entre o vassalo e o seu senhor.
Quanto à sua realização, em muitos aspectos se assemelha aos dias de hoje. Na Idade Média, a cerimônia iniciava-se com o ritual da homenagem. O vassalo, geralmente ajoe-lhado, cabeça descoberta e sem armas, colocava as suas mãos sobre as do senhor e decla-rava verbalmente a vontade de firmar o contrato. Em seguida, de pé e com as mãos sobre os Santos Evangelhos, recitava o juramento de fidelidade. Além disso, principalmente na França, o cerimonial era acompanhado ainda pelo ósculo – beijo da paz e da amizade – e, por vezes, redigia-se um diploma recordando as circunstâncias da solenidade e detalhando as obrigações das duas partes.
Mesmo com idade secular, o juramento ultrapassou barreiras geográficas e resistiu ao tempo. Na colação de grau de alguns cursos, como medicina, por exemplo, leem-se mais de um compromisso profissional. Algumas universidades têm seu próprio texto de jura-mento e ele também é declamado antes de os formandos receberem o diploma. Nesse caso, os formandos não o repetem na íntegra, procedimento comum ao se ler o juramento clássico de Hipócrates, médico grego da Antiguidade, que data de 460 a.C.
Às vezes, a cerimônia de juramento é completada individualmente pelos formandos em frente à autoridade acadêmica (reitor, diretor, coordenador, etc.). Com a mão direita sobre a Bíblia (estrategicamente colocada sobre a mesa solene), cada formando promete exercer a profissão de acordo com os padrões éticos, morais e científicos exigidos. Ao ouvir o com-promisso de cada um, a autoridade acadêmica coloca sobre a cabeça do formando o bar-rete doutoral – a borla – e lhe confere o grau a que tem direito.
É importante notar que a Bíblia, utilizada desde os contratos vassálicos, é depositária desse juramento. Além disso, como livro, tem outro significado. Fechado, simboliza o conhecimento que o novo profissional deve guardar em mente; aberto, mostra a disponi-bilidade do formado para ensinar e atender aqueles que o cercam.
Mesmo com toda a pompa e seriedade da cerimônia, nem sempre o juramento é respei-tado. Na Idade Média, violar um juramento era tornar-se culpado de um perjúrio, ou seja, era pecado mortal. O compromisso vassálico só terminava com a morte do senhor ou do vassalo.
Atualmente, o juramento continua firmando obrigações e sua violação também pode ser punida. Transgredir as normas de ética profissional pode trazer ao formado sérias com-plicações, incluindo a cassação do diploma. A leitura do juramento, por se tratar de item tão importante na colação de grau, deve ser feita por um formando ou formanda (jurador ou juradora) que saibam ler corretamente e que, principalmente, entendam o que estão lendo. De preferência, esse privilégio deve ser dado aos melhores alunos do curso. Só assim os formandos estarão bem representados.
Leitura Médica. Embora chamado de “pai da Medicina”, não se tem muita informação a respeito de Hipócrates. Grego, nasceu na Ilha de Cós, 460 a.C. e morreu em Larissa, na Tessália, entre 375 e 351 a.C. Foi o maior médico da Antiguidade e um dos mais famo-sos de todos os tempos. Sua atuação marca o fim da medicina místico-teúrgica e o início da observação dos fatos clínicos.
Hipócrates escreveu 53 tratados e dentre os mais famosos está o Juramento, o mais antigo
código de ética da medicina. Sob forma abreviada, é recitado cada vez que no Ocidente um médico cola grau. A seguir, seu trecho mais conhecido.
“Prometo que ao exercer a arte de curar mostrar-me-ei sempre fiel aos preceitos da honestidade, da caridade e da ciência. Penetrando no interior dos lares, meus olhos serão cegos, minha língua calará os segredos que me forem revelados, os quais terei como preceito de honra. Nunca me servirei da profissão para corromper os costumes ou favorecer o crime. Seu eu cumprir este juramento com fidelidade, desfrutem eu, a minha vida e a minha arte de boa reputação entre os homens. Se o infringir ou dele me afastar, suceda-me o contrário”.
Amorim Leite